Ainda guardo muitas receitas que preparava no meu passado “não-vegano/vegetariano” para testar substituições. Mas não tudo o que já fez parte do meu repertório, e sim aquelas que eram especiais. Ou ainda, as queridinhas do pessoal aqui em casa. Talvez seja uma forma de resgatar alguns sabores perdidos pelo caminho, e as lembranças que eles carregam.
Contudo, essas adaptações nem sempre são um processo simples (ou que funciona!). Não basta trocar um ingrediente por outro. Pode envolver outros fatores, principalmente quando se trata de um preparo mais complexo, como um bolo ou um pão. Não se engane achando que ovos ou farinha de trigo são ingredientes que podem ser retirados das receitas sem um certo cuidado e alguma pesquisa...
Vale mencionar que mesmo quando as receitas funcionam nas novas versões, algumas vezes o gosto não é aquele que eu esperava resgatar. É comum ficar decepcionada. Ou o meu paladar já está mais distante de muitas referências do passado, e em alguns casos, o que restou foi só a lembrança do momento, e não mais do gosto da comida. O que é um bom motivo para desistir de adaptar inúmeras outras receitas.
A famosa torta salgada de liquidificador teve sua fase áurea algumas décadas atrás. Fico me perguntando se lembro da minha mãe fazendo algo assim quando eu ainda morava com meus pais, ou as memórias são mais recentes. Quando minha filha ainda era criança, essa receita foi feita e refeita em todas as versões possíveis. Principalmente nos dias em que eu não sabia o que preparar para o lanche, ou não tinha tempo de pensar em outra alternativa. Ela foi meu coringa por muito tempo. Cheguei a ter uma forma quadrada de vidro dedicada ao seu preparo, era o "pirex da torta" com suas beiradinhas marrons de queimado do forno.
A receita original consiste em uma massa básica, bem simples e rápida, como o nome já diz, batida no liquidificador. Entre os ingredientes estavam o leite (de vaca) e os ovos. Substituir leite por leite vegetal (ou bebida vegetal como muitos conhecem) não é difícil e costuma dar certo. Já a substituição de ovos é mais complexa e existem algumas possibilidades. No blog do Santo Legume publiquei um infográfico sobre o assunto com algumas dicas.
Quando resolvi adaptar a receita da torta de liquidificador para o bolo salgado de fubá, concentrei a atenção nas alterações da massa para que se tornasse vegana. Parti de outras receitas e testei tantas possibilidades e ideias novas, que no final, essa adaptação resultou em algo bem diferente do original. Além de não conter nenhum ingrediente de origem animal, acabou sem glúten porque usei farinha de aveia, arroz integral e o fubá. Lembrando que, para que a massa fique macia neste caso, é recomendável usar a goma xantana (um assunto para explorar outra hora).
Fiz o recheio com floretes de brócolis (pré-cozidos no vapor) e tomate-cereja cortado ao meio. Mas existem muitas outras possibilidades, começando por aquilo que tem na sua geladeira. Criar variações é uma das partes mais divertidas da receita. Use ervas frescas ou molho pesto na massa e sementes para enfeitar. Para dar um toque agridoce, pincele melado de cana sobre a cobertura. E bom apetite!
Bolo salgado de fubá
Ingredientes
½ xícara de abobrinha ralada (no ralo grosso)
1 xícara de fubá
½ xícara de farinha de aveia
½ xícara de farinha de arroz integral (ou fécula de batata)
½ colher (chá) de goma xantana
1 colher (chá) de sal
1 colher (sopa) de fermento em pó
½ colher (chá) de cúrcuma em pó
¼ colher (chá) de garam masala (opcional)
½ xícara de óleo de vegetal
1 e ½ xícaras de água filtrada
Recheio e cobertura
Tomate seco picado em tirinhas
Alho-poró fatiado bem fino
Palmito em rodelas
Floretes de brócolis pré-cozidos
Azeitonas picadas
Alcaparras
Salsa e cebolinha picadas
2-3 colheres (sopa) molho pesto
Modo de fazer
Aqueça o forno (180 °C). Unte e polvilhe uma forma quadrada (23 cm).
Misture os ingredientes secos em uma tigela grande.
Junte o óleo e a água gradualmente, mexendo para não formar grumos. Em seguida, acrescente a abobrinha picada e o molho pesto, se utilizar.
Pique os ingredientes que for utilizar para o recheio e junte, mexendo somente até incorporar.
Transfira para a forma e cubra com alguns legumes para enfeitar.
Leve ao forno por 30 a 40 minutos, ou até dourar nas beiradas.
Bolinhos de semolina com pesto e tomate seco
Outra sugestão são esses bolinhos preparados com semolina, molho pesto e tomate seco picado. Lembrando que dá para inventar diversas outras possibilidades de recheios.
A sêmola, ou semolina, para quem não conhece, é o resultado da moagem incompleta do trigo. Ela tem uma textura granulada e rústica, mais grossa que a farinha, e é produzida com a moagem de grãos de uma variedade mais dura de trigo. Caso não encontre, substitua por farinha de arroz integral, de quinoa ou de amaranto.
Não estranhe: a massa dos bolinhos não fica lisa e homogênea. No entanto, garanto que o sabor é incrível. Não deixe de testar o molho pesto na massa, faz toda a diferença. E para quem quer se arriscar a fazer o molho pesto em casa, pode dar uma olhadinha na versão vegana da receita que já compartilhei aqui.
Ingredientes
2 colheres (sopa) de azeite de oliva
1 cebola pequena, picada
3 dentes de alho, amassados ou bem picados
3 colheres (sopa) de molho pesto (usei de manjericão)
½ xícara de iogurte (usei o de polpa de coco)
¾ xícara de água
1 colher (chá) de vinagre de maçã
Tomate seco, picado em pedaços pequenos
Folhas frescas de manjericão, salsa, cebolinha (escolha a gosto)
½ xícara de farinha de trigo
½ xícara de semolina de trigo
½ xícara de farinha de grão-de-bico (ou farinha de trigo integral)
2 colheres (chá) de fermento em pó
Sal e pimenta-do-reino
Modo de fazer
Preaqueça o forno (180 °C). Unte forminhas de muffin ou forre com forminhas de papel. Outra alternativa é usar forminhas de silicone.
Aqueça uma frigideira e refogue a cebola no azeite até ficar translúcida. Junte o alho e refogue por mais um minuto. Retire do fogo e junte o molho pesto, iogurte, água e o vinagre. Misture e por último acrescente os pedacinhos de tomate seco e as ervas frescas picadas.
Misture as farinhas em uma tigela com o fermento, sal e pimenta-do-reino. Acrescente a mistura com o molho pesto e o tomate seco. Mexa com cuidado, somente até que os ingredientes estejam incorporados.
Transfira para as forminhas enchendo somente até 3/4 da capacidade. Leve ao forno por 20 a 25 minutos ou até ficarem dourados. Retire do forno e espere alguns minutos antes de desenformar e servir.
Dica de leitura
Chegou o meu livro “Matos de Comer”. Perdi a oportunidade nas primeiras edições e, quando soube do financiamento coletivo para uma nova edição, logo me inscrevi. Soube que ainda restam algumas unidades para entrega sem frete na plataforma da Kickante.
O livro trata de um assunto que me interessa demais, mas que ainda estou só começando a estudar: as PANCs ou, popularmente, "plantas alimentícias não convencionais". O que me chamou a atenção neste livro do Guilherme Raniere é a facilidade para consultar e comparar espécies bem parecidas. Além do que, ele também coloca informações sobre plantas que são tóxicas e podem ser confundidas. Algo que sempre me deixou insegura!
Também gostei da forma como ele “atualizou” a denominação de PANCs para “plantas alimentícias negligenciadas ou subutilizadas”. Acho o termo “não convencionais” um pouco estranho, já que dependendo de onde você estiver, elas são bem populares e consumidas.
Por último…
Fiz uma pausa nas últimas semanas e viajei. Programei essa viagem por meses. Fui para longe, para falar outra língua, outra cultura, olhar um cenário bem diferente e para me sentir completamente desconectada da minha rotina, e me conectar comigo mesma!
Há pouco mais de quatro anos também fiz uma viagem quando recebi um resultado negativo de uma biópsia. Resolvi comemorar e festejar a vida, acreditando que estivesse tudo bem com minha saúde. Quando voltei, tive que repetir o exame, e este, teve o resultado positivo. Quem me acompanha por aqui e pelo blog sabe que passei por tratamentos e cirurgias durante um longo período.
E como sou uma pessoa que acredita em ritos de passagem, me vejo criando momentos de transição, para demarcar a migração de uma fase a outra da minha vida. É como se isso me ajudasse a não ficar presa no meio do caminho… Me obriga a desapegar do que não quero mais levar junto. Possibilita abrir espaço para algo novo.
Essa última viagem teve este significado, demarcar o encerramento de um ciclo. Mesmo sabendo que isso não é o mesmo que acreditar que esteja "curada". Hoje entendo que a verdadeira cura é muito mais profunda e sutil. Aprendi que ainda há muito o que curar dentro de mim.
Durante as férias nas últimas semanas aproveitei para deixar o celular de lado (exceto para tirar algumas fotos). Peço desculpas por não responder alguns e-mails e mensagens enviados durante esse período, pouco a pouco estou colocando tudo em dia. Recebi diversas sugestões de pauta e agradeço a todos que tem participado ativamente para que esse espaço se torne um lugar de troca de ideias. Ele é uma parte importante na minha nova fase de vida!
Um abraço carinhoso,
Monica
Muito bem, Monica. Fico contente em saber que estas bem e que teve momentos de felicidade na viagem! Um grande abraço! Viva a vida! 🥰
Adaptar é uma jornada, né?
Veganizar é gostoso demais <3
Ficamos com água na boca aqui.